Reforma trabalhista não criará empregos, diz presidente do TRT-2
Desembargador critica mudanças na CLT propostas por Temer
Escrito por: Rede Brasil Atual - Eduardo Maretti
Reprodução Youtube
O desembargador Wilson Fernandes, presidente do Tribunal Regional do
Trabalho da 2ª Região (que abrange São Paulo, Região Metropolitana e
Baixada Santista), é enfático ao dizer que a reforma trabalhista, sancionada nesta quinta-feira (13) pelo presidente Michel Temer e
publicada no dia seguinte no Diário Oficial, não vai aumentar o número
de postos de trabalho. “Ela tem sido vendida com a ideia de que vai
combater o desemprego. Isto, segundo minha avaliação, é um equívoco
muito grande”, diz.
Além do fato de que os argumentos utilizados para mudar a lei, em muitos
pontos, são equivocados, o desembargador destaca que, em sua opinião,
os problemas diretamente relacionados ao enorme desemprego de cerca de
14 milhões de pessoas, hoje, no país, é a economia. “É a alteração da
economia que vai trazer novos emprego”, afirma. “O país vive uma crise
política. Esta crise está gerando uma crise econômica, que tem gerado
desemprego.”
Para ele, também ao contrário dos argumentos dos que trabalharam pela
construção da reforma trabalhista, “a lei não traz segurança jurídica”. O
que daria ao sistema essa chamada segurança “é a interpretação
reiterada, uniforme dos tribunais ao longo do tempo”.
Fernandes falou à RBA:
O que o sr. diria aos trabalhadores a respeito de como a reforma trabalhista os afetará?
É importante que o trabalhador compreenda que esta reforma não é a chave
para a solução do emprego no país. Ela tem sido vendida com a ideia de
que vai combater o desemprego. Isto, segundo minha avaliação, é um
equívoco muito grande. O país vive uma crise política. Esta crise está
gerando uma crise econômica, que tem gerado desemprego. Com a crise, os
empresários tendem a resistir ao investimento. Isto provoca retração ao
investimento, e nada tem a ver com legislação trabalhista, que é a mesma
há muitas décadas, com pequenas alterações, e nunca inibiu
investimento. Há alguns anos tínhamos índice de desemprego muito baixo
com a mesma legislação. Imaginar que mudando a lei vão surgir novos
empregos não me parece uma conclusão adequada.
A experiência em outros países mostra o contrário, que essas reformas aumentam o desemprego?
Exatamente. Dou como exemplo a terceirização, que agora pode ser
utilizada na atividade-fim. As empresas que têm empregados atuando na
atividade-fim podem terceirizar contratando empregados terceirizados.
Mas para fazer isso têm que demitir os empregados atuais. Para cada
posto de trabalho novo que abre, tem um desempregado novo na rua. E com
um agravante: os empregados que ela despede não podem ser contratados de
novo em menos de um ano e meio, uma quarentena enorme. A terceirização
não vai gerar rigorosamente um posto de trabalho novo. Mais de cem
artigos da CLT foram alterados. Não sabemos exatamente o que vai ser
alterado por medida provisória. Tem um compromisso, supostamente, do
presidente da República em alterar algumas coisas desse texto.
Um dos pontos seria a questão relativa às mulheres...
A nova lei permite que gestantes trabalhem em atividades insalubres.
Isso é absolutamente inadequado. É muito bom que faça essa alteração,
isso é muito sério. Essa seria uma das alterações que ele faria. Outra
seria a questão do imposto sindical. Mas ontem ouvi que não, que esse
compromisso ele não assumiu. Vamos ter que esperar para ver o que vai
sair daí. Agora, para o trabalhador podemos dizer que os sindicatos vão
perder muita força na negociação. Temos hoje alguns sindicatos que são
fortes e têm legitimidade, representam de fato o trabalhador. Outros, a
grande maioria, não representa coisa nenhuma. A maioria foi criada para
se beneficiar do imposto sindical. No Brasil temos cerca de 17 mil
sindicatos, dos quais mais da metade nunca celebrou uma convenção
coletiva. São sindicatos que não representam nada, nenhuma categoria.
Recebem o imposto sindical. Sem o imposto esses sindicatos menores vão
desaparecer e os grandes vão ter muitas dificuldades de cumprir seu
papel, se não tiverem o imposto sindical para executar suas atividades.
Eu sempre defendi o fim do imposto sindical, mas acho que isso deve se
dar no contexto de uma ampla reforma sindical, o que precisaria ser
paulatino. De um dia para outro, perdendo essa fonte de recurso, vão
morrer de inanição.
Num contexto de altíssimo desemprego, essa reforma se torna ainda mais dramática, não?
Ela não vai gerar nenhum posto novo de trabalho. Sobre a ideia de que
empresários vão investir muito mais porque terão segurança jurídica, eu
insisto muito no seguinte: a lei não traz segurança jurídica. Não é a
lei, é a interpretação reiterada, uniforme dos tribunais ao longo do
tempo que traz segurança jurídica. A nova lei estabelece algumas regras
que o Ministério Público do Trabalho entende que são inconstitucionais.
Até que o Supremo decida isso, esses dispositivos geram muito mais
insegurança. A lei tem alguns poucos dispositivos com aplicação imediata
e que não vão criar grandes discussões, mas tem outros importantes de
constitucionalidade duvidosa.
Por exemplo?
A questão dos honorários advocatícios. A questão dos honorários de
advogado vai fazer com que os advogados passem a ser mais cautelosos na
postulação da ação porque, se pedem mil e ganham cem, vão ter que pagar
honorário sobre o que perderam. Isso pode fazer com que, em uma ação em
que o empregado ganhe alguma coisa, o que ele ganhou vai ser utilizado
para pagar honorário da parte contrária. Isso vai estimular um maior
cuidado na formulação dos pedidos. Até que o TST decida reiteradamente
num ou noutro sentido, não teremos a segurança de que isso fere ou não a
Constituição, se será seguida pelos tribunais ou não.
A lei traz alguns poucos avanços, não em benefício de um empregado, mas
que são importantes para disciplinar algumas matérias. Por exemplo, na
questão do tempo que o empregado perde na condução oferecida pelo
empregador. A jurisprudência manda pagar como hora extra. Isso faz com
que muitos empresários até bem intencionados decidam não dar condução e
contratar empregados mais próximos da empresa. A lei acabou com isso
(estabeleceu o fim da obrigatoriedade do pagamento pelas empresas das
chamadas horas in itinere, o tempo que o trabalhador gasta em
transporte fornecido pelo empregador). Acho um avanço, porque, a
pretexto de beneficiar o empregado, pode dificultar para algumas
pessoas. Conheço o caso de um empresário que tinha 70, 80 empregados de
uma cidade vizinha e tinha que dar condução. Quando ele descobre que tem
que pagar isso como hora extra, manda todo mundo embora e contrata
outros de sua cidade. É uma avanço, mas não vamos dizer que é um
benefício para o empregado. Óbvio que não.
E qual o impacto da reforma na Justiça do Trabalho?
Num primeiro momento essa reforma tem o potencial muito grande de criar
novas discussões judiciais. A tendência é que a gente tenha até
acréscimo das ações. Num segundo momento, não vai cair o numero de ações
propriamente dito. O que vai reduzir muito são os pedidos formulados em
cada ação. Hoje o empregado pede 20 ou 30 coisas diferentes em algumas
ações. Em se admitindo que não seja declarada a inconstitucionalidade da
questão dos honorários, com o tempo o empregado vai deixar de pedir
verbas que ele não tem certeza de que vai ganhar. Um exemplo concreto: o
empregado fez muitas horas extras e não recebeu. Procura um advogado e o
advogado cauteloso vai perguntar: “você tem prova de que fez essas
horas extras?” Se não tiver, melhor não pedir. Se pedir e não ganhar o
pedido, sobre o valor desse pedido vai pagar honorário da parte
contrária.
As ações vão aumentar ou diminuir?
Hoje temos no país quase 5 milhões de ações por ano. Mas estudos do CNJ
demonstram que metade das ações são propostas para cobrar verbas
rescisórias. É o caso do empregado que é despedido e não recebe. Essas
ações não vão deixar de ser propostas, não importa se a lei mudou ou
não. Essas ações vão continuar sendo propostas. Na outra metade, pode
ser que a médio e longo prazo haja uma redução. Eu diria que só ao longo
de alguns anos a gente vai ter estabilidade razoável a respeito de como
devem ser interpretados os novos dispositivos.
A lei vai regularizar algumas situações como a questão do trabalho
intermitente, por exemplo, que é apresentada como algo que garante ter
registro. Mas de que adianta o trabalhador ter registro se não sabe
quantos dias vai trabalhar por mês, nem se vai trabalhar, nem quanto vai
ganhar. Na verdade isso é uma segurança para o empresário, não para o
empregado. Não estou dizendo que devesse ser assim ou diferente. O
Judiciário não tem que defender este ou aquele movimento da lei, mas
aplicar a lei como está publicada. Isso não me retira o direito de dizer
que os argumentos utilizados para mudar a lei em muitos pontos são
equivocados. Na questão do desemprego, por exemplo, a lei não vai mudar
isso, obviamente. É a alteração da economia que vai trazer novos
empregos.
FONTE: site da Central Única dos Trabalhadores (http://cut.org.br/noticias/reforma-trabalhista-nao-criara-empregos-diz-presidente-do-trt-2-6623/)
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