A Câmara dos Deputados realizou, nesta quarta-feira (18), comissão geral para debater a terceirização consubstanciada no PL 4.330/2004, do deputado Sandro Mabel (PMDB-GO).
Durante cinco horas de debates, “a Casa do povo” ficou sem a presença desses verdadeiros detentores do poder em cumprimento à recente decisão da Mesa Diretora de limitar a quantidade de pessoas nas dependências da Câmara dos Deputados.
Com isso, poucas pessoas puderam assistir ao vivo, no plenário e nas galerias, as discussões acerca da terceirização, tema que está da ordem do dia do Parlamento, na agenda do movimento sindical, e é de suma importância para os trabalhadores, a sociedade e o País. Mancharam a democracia participativa.
Para a comissão geral foram convidados 74 debatedores, escolhidos entre representantes de centrais sindicais, entidades patronais, associações de classe e ministros do Tribunal Superior do Trabalho. E dentre esses, apenas 21 tiveram tempo para se pronunciar.
Nem todos falaram, mas os que puderam se posicionar contra ou a favor da matéria intensificaram o quanto projeto é polêmico e não há consenso para a sua apreciação ou pretensa votação na Casa.
“Congresso, Casa do Povo?”
“Se essa é a Casa do Povo, a polícia não pode bater no povo na porta da Casa. Se essa é a Casa do Povo, o plenário e as galerias deveriam estar lotadas”, disse o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Wagner Freitas.
Para o representante sindical, o que se busca com “o projeto de terceirização é substituir mão de obra para obtenção de lucro, portanto, com precarização de contrato de trabalho e redução de direitos trabalhistas”.
“Caso a Câmara dos Deputados e o Senado Federal aprovem essa matéria, vamos pedir à presidente Dilma que vete integralmente o PL 4.330 que fragmenta, prejudica e não soluciona os problemas da terceirização”, garantiu.
Descontentamento com o Parlamento
Ao iniciar sua fala, o presidente da Nova Central Sindical, José Calixto Ramos externou seu “descontentamento com o tratamento dado à NCST, central que tem mais de mil entidades sindicais filiadas e recebeu apenas seis convites para participar dos debates no plenário da Casa”.
E continuou: “o ideal seria não discutir terceirização que representa desorganização para o movimento sindical; retira do Estado o poder de fiscalização ao estabelecer que uma empresa fiscalize outra; piora as condições de vida e de trabalho dos trabalhadores; o terceirizado tem remuneração 27% menor de quem trabalha na mesma função; terceirização representa 25% do mercado de trabalho e boa parte dos terceirizados estão na informalidade”, garantiu.
Efeitos nocivos da terceirização
“A regulamentação da terceirização vai provocar um efeito avassalador nas conquistas dos trabalhadores, reduzir a renda em até 30% e colocar em risco a saúde dos trabalhadores com a massificação da terceirização dos serviços”, disse o ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Maurício Godinho Delgado.
O magistrado destacou também o posicionamento contrário ao projeto de terceirização assinalado por 19 ministros do TST (76% da Corte), por 24 presidentes de tribunais regionais do trabalho e por todos os corregedores dos tribunais trabalhistas do País.
“O PL 4.330 generaliza a terceirização no Brasil em vez de regulamentar e restringir essa modalidade de contrato de trabalho. O desaparecimento de categorias profissionais ocorrerá naturalmente porque as empresas tendem a terceirizar serviços”, assegurou Delgado.
Súmula e jurisprudência sobre terceirização
Para o também ministro do TST, Alexandre Agra Belmonte, a proposição retira limites estabelecidos por decisões judiciais ao longo do tempo e precariza as relações de trabalho ao trocar, por exemplo, o que é seguro por inseguro na substituição do conceito de atividade fim por especialização.
E foi além: “o País não tem apenas a Súmula 331 do TST tratando sobre o tema. Temos toda a jurisprudência formulada ao longo do tempo para tratar com dignidade os cerca de 15 milhões de trabalhadores terceirizados”.
Desejo da classe trabalhadora e as necessidades do País
“Queremos trabalho decente e a não aprovação deste projeto que permite a terceirização de todos os trabalhadores. Sempre são discutidos nesta Casa o que é ruim para a classe trabalhadora. Por que não debatemos a Convenção 158 da OIT e a redução da jornada de trabalho?”, questionou o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah.
Já para o presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), Ubiraci Dantas de Oliveira, “o Brasil necessita reduzir os juros, reduzir a emissão de lucros pelas empresas multinacionais para o exterior, impedir a falência e a venda de empresas nacionais e se os 19 ministros do TST são contra o projeto da terceirização juntamente com todas as centrais sindicais é porque essa proposta não atende aos interesses do País”, disse.
25 anos da CF e 70 da CLT
Para o deputado Ricardo Berzoini (PT-SP), ao se reportar à fala do deputado Santiago, “se a Câmara dos Deputados não sabe terceirizar, é dever nosso fazê-lo”. E disse mais: “o que busca esse projeto é acrescentar na lei a interposição fraudulenta de mão de obra, o que é inconstitucional”.
“Estão propondo também a fragmentação da organização sindical dos trabalhadores, mas mantendo intacta a estrutura do ‘Sistema S’”, disse o parlamentar, que é ex-ministro do Trabalho na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Ao finalizar, Berzoini lembrou os 25 anos da Constituição Federal e dos 70 anos da CLT que são comemorados neste ano. “Esse é um momento emblemático e querem rasgar a CLT e a CF aprovando esse projeto. A bancada do PT é contra essa matéria”, garantiu.
“Terceirização é análoga a trabalho escravo”
Para o deputado Ivan Valente (SP), líder do PSol na Câmara dos Deputados, “o objetivo do PL 4.330 é aumentar o lucro patronal e ao mesmo tempo estender a terceirização para qualquer atividade seja meio ou fim. Terceirização é análoga ao trabalho escravo”.
Ainda segundo o parlamentar, “é notório o fato de que os trabalhadores terceirizados têm rendimento 27% menor que os trabalhadores formais, a jornada de trabalho é 3 horas maior e a rotatividade nesse setor é alta, em torno de 45%”, disse.
“Tudo isso justifica uma campanha em todo o País contra o projeto, que é um retrocesso trabalhista. O Brasil sonha com justiça social e distribuição de renda, não podendo o lucro estar acima dos direitos sociais e trabalhistas”, sugeriu.
Menor salário, maior acidente de trabalho
Para o presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Carlos Eduardo de Azevedo Lima, “o combate a fraudes trabalhistas comprovam menor salário, maior quantidade de acidentes e alta rotatividade de mão de obra no trabalho terceirizado, o que é em si precarização”.
Para que um projeto de terceirização seja aprovado, o procurador defende as seguintes premissas: 1) responsabilização solidária; 2) vedação de prestação de serviço na atividade fim; e 3) tratamento isonômico entre trabalhadores terceirizados e formais.
QUEM É A FAVOR A TERCEIRIZAÇÃO
Também ocorreram discursos a favor da terceirização, dentre outros de representantes da CNI (Confederação Nacional da Indústria), CNC (Confederação Nacional do Comércio).