Lei foi criada sob o pretexto de criar empregos e dar “segurança jurídica”, mas desemprego aumentou
Aprovada há quatro anos, a Lei 13.467, de “reforma”
da legislação trabalhista e sindical, tramitou sob
sucessivas promessas governistas de criação de
postos de trabalho e segurança jurídica. Os empregos
não vieram até hoje, e a lei continua sofrendo
questionamentos, inclusive jurídicos. “As promessas
da reforma eram falsas”, afirma a desembargadora
aposentada Magda Barros Biavaschi. “Não é se
flexibilizando, retirando direitos, isso todas as
pesquisas mostram, que se dinamiza a economia”,
acrescenta.
Para o professor Marcio Pochmann, há pelo menos
cinco anos o país “perdeu o rumo do ponto de vista
da perspectiva de voltar a crescer”. São quatro
fases de recessão desde os anos 1990. “Iniciamos
2021 com a economia 7% menor do que era em 2014”,
comenta. E a “reforma” trabalhista, termo que ele
considera inadequado, configurou o “maior ataque” em
décadas contra os trabalhadores, atingindo também o
movimento sindical.
“Deformação” do sistema
Magda e Pochmann participaram, na semana que passou, de curso sobre os efeitos da reforma implementada em 2017. O evento, que vai até a próxima quinta-feira (29), é organizado por entidades ligadas à Justiça do Trabalho na 2ª e na 15ª Região, em São Paulo (Aojustra, Sindiquinze e Ejud2).
Para o professor da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp), as mudanças implementadas ainda
no governo Temer, em 2017, não foram uma
reformulação, mas “uma deformação do sistema
corporativo de relações do trabalho”. E
enfraqueceram as próprias condições, políticas e
materiais, que haviam viabilizado a CLT. Mudanças,
assinala o economista, que refletem algo que já vem
acontecendo no Brasil há pelo menos três décadas,
com a inserção do país na chamada globalização.
Entrada passiva na globalização
“A partir de 1990, o Brasil se inseriu de forma passiva e subordinada a esse movimento a que muitos países se integraram, conduzido por grandes corporações transnacionais. reduzindo a capacidade de decisão do país”, diz Pochmann. Nesse período, foi se desindustrializando. “Não só esvaziamento da manufatura na atividade econômica, mas sobretudo seus efeitos sistêmicos sobre a sociedade, movimento que leva à ruína da antiga sociedade urbana e industrial.”
Assim, emenda o professor, ocorreu uma
“desconstrução” de classes sociais: tanto a
burguesia industrial como a classe operária
industrial. “Em 1980, por exemplo, o Brasil tinha a
sexta maior indústria do mundo. Em 2020, a indústria
brasileira está na 16ª posição do mundo.” Isso
também levou ao enfraquecimento do que ele chama de
“eixo estruturador do novo sindicalismo brasileiro,
que era basicamente a classe operária industrial”.
Empresário virou rentista
Nessa “metamorfose”, empresas foram vendidas ou fechadas, e o sistema financeiro passou a prevalecer. “O empresário industrial se tornou um sócio dos juros, um rentista.” Assim, em muitos casos o Brasil passou, em vez de produção própria, a ter centros de montagem de produtos importados.
Ele observa ainda que o Brasil sempre teve uma massa
de trabalhadores fora da formalidade do registro.
“Os sindicatos, na verdade, representavam uma
parcela importantíssima, mas havia uma classe
trabalhadora inorgânica. Autônomos, por conta
própria, desempregados, sem registro.” Esse processo
de desassalariamento chegou a ter certa interrupção
na segunda metade dos anos 2000, quando se dizia que
não havia mais espaço para isso, mas o emprego com
carteira cresceu.
Tentativas de mudança
Enquanto isso, o Brasil perdeu oportunidades de reformular, de forma negociada, seu sistema de relações do trabalho. Pochmann cita tentativas de implementar o contrato coletivo, quando Walter Barelli era ministro do Trabalho, no início dos anos 1990, ou o tripartite Fórum Nacional do Trabalho, implementado pelo governo Lula em 2004. Até chegar à atual “alteração dramática, profundamente desfavorável aos trabalhadores”, com forte concentração no setor de serviços.
Magda Biavaschi também fez uma digressão histórica
do sistema de trabalho brasileiro, “construído com
muitas dificuldades a partir de 1930, pari passu ao
processo de industrialização”. De um “fazendão”,
como diz, o país se tornou a oitava economia
mundial. Formou um sistema público de proteção
social, com normas e instituições. Um sistema que
enfrentou desafios, “idas e vindas”, como a ditadura
e o período do chamado Consenso de Washington, já no
início da década de 1990: livre comércio,
liberalização de patentes, desregulamentação.
Flexibilizar e desregulamentar
Mais recentemente houve, além da “reforma” de 2017, a aprovação de uma série de leis no sentido da flexibilização, como a que ampliou a terceirização. Nesse sentido, a desembargadora ressalta o papel do Supremo Tribunal Federal (STF). “O Supremo passou a deslegitimar a voz do próprio TST (Tribunal Superior do Trabalho). Criando condições materiais, até, para a reforma trabalhista que veio em 2017. Por isso que nós dizemos que o STF, por maioria de votos, passou a constituir a antessala da reforma trabalhista”, diz Magda. O processo se consolidou com o “presente de Natal” de Temer aos trabalhadores, apresentando seu projeto de reforma em 23 de dezembro de 2016, centrado na premissa de prevalência do negociado sobre o legislado.
“Ou seja, no transtrocar das fontes do Direito do
Trabalho”, afirma a desembargadora. Com isso, o
contrato individual “poderá e será a fonte
prevalente, podendo se sobrepor, sobretudo, à
regulação pública universal”, constata. “Só que isso
desregulamenta, mercantiliza. Mercatilizando,
precifica e coloca nas forças do mercado o poder de
dispor sobre o uso da força de trabalho.” E isso
também atingiu as instituições públicas, a própria
Justiça do Trabalho e os sindicatos.
Desemprego e desalento
Tudo isso com o discurso de que era preciso “retirar a rigidez” da legislação, porque isso afastava investimentos e inibia o crescimento econômico. O que se viu, conclui Magda, foi “aumento substantivo do desemprego, da informalidade, desalento, terceirizados não incorporados”.
E, além dos atuais 14,8 milhões de desempregados, um
enorme contingente de pessoas fora da força de
trabalho: 76,4 milhões, segundo o dado mais recente
a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad)
Contínua, do IBGE. Os excluídos, para quem, diz
Magda, é preciso pensar em um sistema público de
proteção. E também em uma organização sindical que
represente essa “massa nova” de trabalhadores da
economia brasileira.
Pelos dados da Pnad Contínua, em 2020 a taxa média
de desemprego foi de 13,5%, ante 8,5% em 2015. O
total estimado de desempregados aumentou de 8,5
milhões para 13,4 milhões – o dado mais recente
aponta 14,8 milhões. E o número de excluídos da
força de trabalho subiu de 63 milhões para 75
milhões.
Fonte: Rede Brasil Atual - Do Blog de Notícias da CNTI
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