A contratação de trabalhadores como pessoa jurídica já custou ao menos R$ 89 bilhões aos cofres públicos desde a reforma trabalhista e é um risco para a Previdência Social, diz um estudo sobre o tema realizado por pesquisadores da FGV. Isso ocorre porque esse tipo de contrato recolhe menos impostos do que o contrato CLT. O STF (Superior Tribunal Federal) vai decidir sobre o tema.
Custo bilionário
Número de trabalhadores por conta própria cresceu até 90%. De final de 2017, quando foi aprovada a reforma trabalhista, até 2023, o número de trabalhadores por conta própria classificados como MEIs (com renda de até R$ 6.750 por mês) aumentou 24%. Já o número de trabalhadores classificados como empresas do Simples Nacional (renda de mais de R$ 6.750 até R$ 400 mil mensais) teve crescimento de 90%.
Dado está na nota técnica sobre os impactos da
pejotização na arrecadação tributária. O
levantamento foi elaborado por Nelson Marconi,
coordenador do curso de graduação em administração
pública da FGV, e Marco Capraro Brancher, consultor
da FGV, a pedido da seccional paulista da OAB, e
publicado em junho de 2024.
Pejotização custou entre R$ 89 bilhões e R$ 144
bilhões aos cofres públicos nos últimos anos. Os
pesquisadores fizeram a conta de quanto os
trabalhadores contratados como pessoa jurídica após
a reforma trabalhista gerariam de arrecadação a
mais, caso tivessem sido contratados como CLT. A
conclusão foi que o governo deixou de arrecadar
entre R$ 89 bilhões e R$ 144 bilhões entre 2018 e
2023.
Como PJ, cada um desses trabalhadores gerou em média
R$ 4 mil em imposto em 2023. O valor considera
Imposto de Renda mais os impostos pagos como MEI ou
empresa do Simples Nacional. Se fossem contratados
como CLT, os impostos pagos ficariam entre R$ 21 mil
e R$ 33 mil em 2023, a depender do tipo de Empresa
contratante.
"Do ponto de vista social, os trabalhadores têm
perdas em termos de direitos, como férias, décimo
terceiro e aviso prévio. Para o lado da empresa,
isso flexibiliza o mercado de trabalho e diminui
encargos. Mas, do ponto de vista econômico, tem um
impacto muito forte na arrecadação. Diminui o
dinheiro para financiar políticas públicas." -
Nelson Marconi, coordenador do curso de graduação em
administração pública da FGV.
Perda arrecadatória tem impacto na Previdência e no
déficit público, dizem os pesquisadores. O
levantamento pondera ainda que os gastos públicos
também são afetados, uma vez que quem é MEI tem
direito a se aposentar com um salário mínimo e
acesso à Previdência Social. “São pessoas que terão
menos acesso a plano de saúde e vão recorrer ao
sistema público. Não terão aposentadoria e vão
demandar do governo alguma proteção social”, diz
Marconi.
Caso a pejotização seja ampliada, impacto será muito
maior. Os pesquisadores também calcularam qual seria
o impacto da pejotização, caso mais trabalhadores
fossem contratados como PJ. A simulação leva em
consideração a tendência do STF de reconhecer esse
tipo de contrato. Se metade dos trabalhadores CLT em
2023 se tornassem trabalhadores por conta própria, a
perda de arrecadação chegaria a mais de R$ 384
bilhões em apenas um ano, diz o estudo.
Cenário é extremo, mas possível, diz pesquisador.
“Calculamos para ter uma simulação. Mas acredito que
é possível. Se o STF aprovar a terceirização dessa
forma, vai gerar uma escalada de contratações no
regime PJ. Mesmo que seja metade disso, 25% da força
de trabalho, já seria uma queda brutal na
arrecadação”, diz Marconi.
Estudo considerou apenas trabalhadores por conta
própria formais. Os cálculos do estudo consideram
apenas os trabalhadores que possuem CNPJ, e exclui
os demais empregados formais e informais. Também
foram desconsiderados os trabalhadores que não
poderiam ser enquadrados no Simples Nacional ou como
MEIs, devido ao patamar de rendimentos ou à
atividade exercida. “O grupo restante é aquele que,
supostamente, poderia estar trabalhando como
empregado com carteira assinada e foi “pejotizado””,
dizem os pesquisadores.
É terceirização ou pejotização?
Após a reforma trabalhista, as reclamações sobre pejotização inundaram o STF. “Muitas empresas foram ao STF reclamar de decisões da Justiça do Trabalho em situações como a da pejotização. O direito do trabalho se tornou o assunto principal das reclamações constitucionais no STF”, diz Olivia Pasqualeto, professora de Direito da FGV, que também estuda o tema e cuja pesquisa é citada no estudo sobre arrecadação.
Supremo tem validado contratações como PJ. Em um
estudo de 2023, Pasqualeto e outras duas
pesquisadoras analisaram as reclamações sobre o tema
no STF. A conclusão foi que o Supremo tem decidido
de forma favorável às contratações como PJ, mesmo
nos casos em que a Justiça do Trabalho entendeu que
havia uma relação de trabalho disfarçada.
Uma das críticas às decisões do STF é que a
terceirização, que foi liberada com a reforma
trabalhista, é diferente da pejotização. “A
terceirização envolve três partes. Quem trabalha em
uma empresa terceirizada continua tendo um vínculo
de emprego. A pejotização envolve apenas duas
pontas. E o PJ não tem vínculo de emprego e nenhum
dos direitos trabalhistas conventionais, diz a
Professora.
Requisitos para contratação CLT ficam nebulosos, diz
pesquisadora. Ao analisar os casos de pejotização, a
Justiça do Trabalho verifica se existem requisitos
como a subordinação e a pessoalidade (quando a
função não pode ser transferida para outra pessoa).
Quando os elementos previstos estão presentes, a
contratação deve ser via CLT, diz Pasqualeto.
"São requisitos que continuam valendo mesmo após a
reforma trabalhista. Quando o STF diz que qualquer
relação vai ser lícita, ficamos sem saber qual
elemento vai diferenciar uma coisa da outra. Fica
nebuloso saber o que deve ser regido pela CLT." -
Olivia Pasqualeto, professora de Direito da FGV.
Ações suspensas
O ministro Gilmar Mendes, do STF, suspendeu todos os processos sobre o tema. A decisão, de 14 de abril, afeta todas ações que discutem a legalidade da contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para prestação de serviços. A suspensão vale até o julgamento definitivo do tema, que será analisado com repercussão geral – ou seja, o resultado deverá ser seguido por todos os tribunais que julgarem a mesma questão.
Suspensão afeta milhares de ações em tramitação e
expõe um embate entre o STF e a Justiça trabalhista.
A Justiça do Trabalho tinha quase 460 mil ações
sobre reconhecimento de relação trabalhista em 2024.
Dentre os pontos a serem decididos pelo Supremo está
a competência da Justiça do Trabalho para julgar
casos desse tipo.
Fonte: UOL - Do Blog de Notícias da CNTI -- https://cnti.org.br/html
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