Por Clemente Ganz Lúcio
A crise sanitária, além de provocar mortes e sofrimento para milhões de pessoas, carregou a economia para uma outra crise porque a proteção à vida e a saúde exigiram a paralisação das atividades produtivas de setores e empresas e desorganizou cadeias produtivas e fluxos de abastecimentos de insumos, promovendo o deslocamento de milhões de trabalhadores para o desemprego, a inatividade, o desalento e o subemprego.
No Brasil, segundo o IBGE, estavam desempregados em
agosto cerca de 13,7 milhões de trabalhadores e mais
de 31 milhões de pessoas que participam da força de
trabalho do país eram consideradas subutilizadas
(desempregadas, desalentadas, inativos ou com
jornada de trabalho insuficiente). De outro lado,
piora a cada dia a expectativa sobre o crescimento
econômico. O país continua derrapando na política
econômica do governo, as empresas continuam indo
embora ou fechando, a desindustrialização avança.
Em 2008 o mundo passou por uma grave crise
econômica. Buscando respostas para os severos
impactos sobre o mundo do trabalho, os
representantes de governos, empregadores e
trabalhadores presentes na 98ª Conferência
Internacional da OIT – Organização Internacional do
Trabalho (junho/2019) apresentaram um conjunto de
diretrizes para enfrentar a crise mundial do emprego
que foram reunidas no documento “Um Pacto Mundial
para o Emprego”.
Agora a emergência sanitária traz a urgência de
enfrentar uma nova crise global do emprego. Por isso
consideramos que a iniciativa da OIT precisa ser
renovada para enfrentar o contexto atual de
desemprego, queda da renda do trabalho e
desestruturação do sistema produtivo. A seguir
destacaremos diretrizes do “Pacto pelo Emprego” de
2019, que são atuais e que deveriam estar no centro
da política econômica dos países, inclusive do
Brasil.
A OIT indica que os esforços globais devem ser
orientados por uma visão deferente – como, por
exemplo, aquela que foi recentemente debatida na COP
26 -, coordenados para construir respostas para o
emprego, com empresas sustentáveis, com qualidade do
serviço público, na proteção das pessoas,
preservando seus direitos, o diálogo social e a
participação coletiva. Desafortunadamente o Brasil,
por escolha do seu governo, tem caminhado no sentido
contrário a essas diretrizes.
Nessa linha de ação, o Pacto indica a urgência à
proteção e crescimento do emprego, com especial
atenção às mulheres e homens vulneráveis, à
juventude, aos trabalhadores mal remunerados, pouco
qualificados, informais e migrantes. Políticas
orientadas para manter os empregos, para facilitar a
mobilidade profissional e favorecer o acesso aos
postos de trabalho.
No caso do Brasil, cabe prioridade para a
reorganização e revitalização do Sistema Público de
Emprego, Trabalho e Renda, o que inclui medidas de
proteção dos empregos e da renda do trabalho,
ampliação do seguro-desemprego, fortalecimento da
intermediação pública de mão-de-obra, a formação
profissional continuada e integrada entre escola e
trabalho, o microcrédito produtivo, o apoio e
assistência à economia solidária e popular, ao
cooperativismo e à agricultura familiar.
A política centrada no emprego deve ter por objetivo
evitar a queda dos salários, a deterioração das
condições de trabalho, promovendo as normas
fundamentais do trabalho decente e reduzindo a
desigualdade entre homens e mulheres, incentivando a
negociação coletiva, favorecendo à criação de
empresas e a geração de empregos em diversos
setores.
Para enfrentar o risco de desemprego de longa
duração e o aumento da informalidade, tendências de
difícil reversão, deve-se buscar o pleno emprego
produtivo com trabalho decente por meio de políticas
macroeconômicas que impulsionem a demanda efetiva, a
manutenção dos níveis salariais, articulando
políticas ativas do mercado de trabalho e
mobilizadas pelos serviços integrados por um Sistema
Público de Emprego.
Esforços devem ser envidados para que as empresas
sejam capazes de manterem ou retomarem suas
atividades produtivas, mantendo seus trabalhadores,
apoiando a criação de empregos em vários setores da
economia e seus efeitos multiplicadores.
Ter a atenção para o papel central que as micro,
pequenas e médias empresas e o cooperativismo têm na
criação de empregos e a necessidade de apoio e
assistência.
Medidas emergenciais devem mobilizar o poder público
para realizar investimentos para a realização e
retomada de obras, entre outras medidas de criação
direta de empregos, inclusive com atenção especial
para a economia informal.
Nessa perspectiva de ações emergenciais vinculadas a
um projeto estrutural de desenvolvimento
sustentável, deve-se articular os investimentos em
infraestrutura econômica e social, em pesquisa e
inovação, na promoção de “serviços verdes” e nas
atividades relacionados aos cuidados das pessoas e
do meio ambiente.
Deve-se buscar reforçar os sistemas de proteção
social para proteger as pessoas e famílias, para dar
suporte à renda que sustenta a demanda, para
combater o aumento da pobreza e das desigualdades.
Nessa linha convergem os programas de proteção de
renda (Bolsa Família e Auxílio Emergencial),
integrados aos programas de proteção à saúde,
assistência, educação, com atenção para os idosos, a
juventude, às crianças, buscando aumentar a duração
e a cobertura desses programas.
Para evitar a espiral deflacionaria dos salários, a
OIT indica o diálogo social, a negociação coletiva e
as políticas relacionadas à valorização do salário
mínimo.
Esse arcabouço de diretrizes deve ter como elemento
constitutivo o respeito aos princípios e direitos
fundamentais no trabalho, o combate contínuo ao
trabalho forçado, ao trabalho infantil e à
discriminação no trabalho. Respeitar a liberdade
sindical, o direito à sindicalização e à negociação
coletiva.
Em momento tão graves o caminho a ser seguido
deveria convergir para o fortalecimento do diálogo
social, capaz de sintonizar a nação por meio das
suas organizações a construir caminhos e políticas
adequadas a cada contexto situacional, que legitimem
as escolhas coletivas.
O nosso desafio é abrir uma outra trajetória de
futuro, muito diferente daquela que o país vem
trilhando, intencionalmente convergente com as
diretrizes acima, com o fortalecimento do Estado
Democrático de Direito, o diálogo social, o
compromisso com o desenvolvimento sustentável e a
justiça social.
Fonte: Agência Sindical - Do Blog de Notícias da CNTI
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