As decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que
validam a chamada “pejotização” podem gerar uma
perda bilionária de arrecadação. Levantamento da
Fundação Getulio Vargas (FGV-SP) aponta que se os
trabalhadores que atuam por conta própria, após a
promulgação da reforma trabalhista, tivessem sido
contratados como celetistas, a arrecadação poderia
ser elevada em pelo menos R$ 144 bilhões – caso
todos fossem empregados em empresas do lucro real ou
lucro presumido -, considerando os valores
acumulados entre 2018 e 2023.
Caso fossem contratados como empregados em empresas
do Simples Nacional, representaria uma arrecadação
de R$ 89 bilhões. Esses valores representam,
respectivamente, cerca de 6,2% ou 3,8% da
arrecadação pública federal de 2023. As informações
estão na “Nota Técnica sobre o Impacto da
Pejotização sobre a Arrecadação Tributária”,
encomendada pela seccional paulista da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB- SP), obtida com
exclusividade pelo Valor.
O estudo foi realizado pelo economista Nelson
Marconi, professor coordenador do curso de graduação
em administração pública da Fundação Getulio Vargas,
e pelo pesquisador Marco Capraro Brancher.
A nota técnica traz diversas estimativas de perda de
arrecadação, considerando o cenário posterior à
edição da reforma trabalhista (Lei nº 13467, de
2017), que incentivou a contratação por meio de
pessoas jurídicas.
A avaliação parte da consideração ainda de que
centenas de contratos via pessoa jurídica estão
sendo validados pelo Supremo, conforme a pesquisa
“Terceirização e Pejotização no STF: Análise das
Reclamações Constitucionais”, desenvolvida pela
professora Olívia Pasqualeto, que também foi
divulgada com exclusividade ao Valor.
Em uma outra simulação, considerando a suposição de
que deve haver o avanço da pejotização com o passar
dos anos, presumindo que 50% da força de trabalho
com carteira assinada passe a atuar como pejotizada,
a perda arrecadatória, nesse caso seria de seria da
ordem de R$ 384 bilhões. Essa redução corresponde a
16,6% da arrecadação federal de 2023.
Regime de Trabalho impacta arrecadação
De acordo com o professor Nelson Marconi, as estimativas demonstram um relevante impacto das mudanças no regime de trabalho sobre a arrecadação tributária. “É uma perda significativa e que causa impacto relevante nas contas públicas, em um momento que o governo está promovendo mecanismos para aumentar a arrecadação”, diz. Para ele, além das perdas sobre os direitos sociais, existe esse impacto tributário que não está sendo considerado.
O professor ainda ressalta que o poder de
fiscalização e controle por parte da Receita Federal
também seria enfraquecido, caso exista essa
tendência maior à “pejotização”, pois é mais difícil
fiscalizar muitas empresas com somente um
funcionário que poucas empresas com muitos
funcionários, cujo recolhimento se dá diretamente na
fonte e de forma concentrada.
Gustavo Granadeiro Guimarães, presidente da Comissão
de Advocacia Trabalhista da OAB-SP, considera que a
competência da Justiça do Trabalho, prevista no
artigo 114 da Constituição, “vem sendo
paulatinamente suprimida por decisões da Suprema
Corte”.
“A sociedade civil precisa ser conscientizada, pois
as consequências não colocam em risco apenas a
Justiça do Trabalho, mas a própria existência de
direitos trabalhistas.”
Ele afirma que é preciso chamar a atenção para o
risco de verdadeiro rombo fiscal e previdenciário
que essa tendência do STF representa. “Haverá
drástica redução das folhas de pagamento das
empresas”, afirma ele, acrescentando que a Justiça
do Trabalho é responsável pela arrecadação de
bilhões de reais em impostos anualmente.
No fim de outubro, a Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional (PGFN) chegou a se manifestar contra a
tendência de admissão de reclamações contra decisões
trabalhistas sobre vínculo empregatício,
principalmente envolvendo profissionais contratados
como pessoa jurídica.
Segundo o documento, assinado pelo procurador Carlos
de Araujo Moreira, a prestação de serviço por
profissionais na modalidade pessoa jurídica não é,
por si só, considerada fraude à relação de emprego.
Mas, afirma, não é possível admitir que um contrato
seja firmado apenas para driblar a legislação, sem
se considerar a realidade.
“Tal artifício aniquilaria o dever que vincula
profissionais liberais qualificados ao pagamento de
Imposto de Renda e desfalcaria o caixa da
Previdência social, afastando-se da incidência da
contribuição social patronal”, diz no documento. A
manifestação foi anexada em reclamação de relatoria
do ministro Edson Fachin (RCL 60620).
Entre 2019 e junho de 2023, mais de 780 mil casos
envolvendo pedidos de reconhecimento de vínculo
foram levados à Justiça do Trabalho, segundo balanço
da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Fonte: Valor Econômico - Do Blog de Noticias da CNTI - https://cnti.org.br
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