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quarta-feira, 3 de agosto de 2022

Para alimentar suas famílias, 80% das brasileiras estão endividadas

EBC/DIVULGAÇÃO
domesticas
 
Em lares chefiados por mulheres, elas são as únicas responsáveis pelo sustento. Diferentemente de lares chefiados por homens, que geralmente têm uma mulher para compartilhar a composição da renda

São Paulo – No Brasil que voltou ao Mapa da Fome da ONU desde o golpe de 2016, 80,1% das mulheres contraíram dívidas sobretudo para colocar comida na mesa de sua família. O dado é de pesquisa da Confederação Nacional do Comércio, que revela também que o endividamento é maior entre as mulheres do que entre os homens (76,5%). E que de 2021 para cá, avançou muito mais entre as mulheres (10,5 pontos percentuais).

A renda dessas mulheres é praticamente toda comprometida com a compra de alimentos, gás, pagamento de aluguel e energia, diferentemente das famílias com renda superior. “No caso dessas que recebem de 1 a 2 salários mínimos, o comprometimento está com a sua sobrevivência e da sua família. Não tem pra onde fugir. Ou são forçadas a se endividar ou a viver em condição de insegurança alimentar. Ou ainda a buscar ajuda de parentes e pessoas da comunidade. Mas geralmente as pessoas da família já estão nessa mesma situação. É se endividar ou morrer de fome”, afirma a economista Marilane Teixeira, professora e pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (Cesit), da Unicamp

Em entrevista hoje (2) ao Jornal PT Brasil, Marilane disse que as causas dessa diferença do endividamento entre as mulheres em relação ao entre homens são estruturais e conjunturais. Estruturais porque as mulheres brasileiras estão em situação mais desfavorável no mercado de trabalho. Recebem salários em média 25% mais baixos que os homens. “E quando se olha para dentro da realidade das mulheres negras é ainda mais acentuada, podendo chegar a 40%”.

Nessa perspectiva de renda menor, as mulheres têm muito mais dificuldades para acompanhar o atual processo de aumento desenfreado dos preços, segundo Marilane. A inflação, que no ano já está acumulada em 12%, tem impacto negativo sobre o rendimento que já vinha caindo nos últimos anos.

Mulheres têm maior queda nos rendimentos

Ou seja, o salário pago em 2019 não compra os mesmo produtos e serviços que comprava em 2022. Além disso, as mulheres são as mais afetadas pelas consequências da pandemia de covid-19, como o desemprego. A maioria perdeu seu posto de trabalho. E quando conseguiu voltar, a média de rendimentos era de 11 a 15% menor.

“Então tem uma inflação que corrói o poder aquisitivo, sobretudo das mais pobres, um problema estrutural que está nas diferenças salariais entre homens e mulheres. Ou seja, para dar conta dos mesmos compromissos, as mulheres têm menos recursos disponíveis que os homens, além da queda dos rendimentos reais. Lembrando que as mulheres correspondem hoje a cerca de 46% da chefia dos domicílios brasileiros”, disse Marilane. A economista chama atenção para o fato de que o Censo de 2022 poderá surpreender a todos com o aumento expressivo de mulheres chefiando os domicílios.

Um agravante é que em lares chefiados por mulheres elas são as únicas responsáveis pelo sustento. Diferentemente de lares chefiados por homens, que frequentemente têm ao menos uma mulher para compartilhar a composição da renda.

Além disso, nesse último período, é muito mais expressivo o número de mulheres que perderam o emprego do que homens. “Temos problemas estruturais que se somam aos conjunturais. E a essa crise econômica profunda, à inflação descontrolada, o governo Bolsonaro, por meio do Banco Central, tem adotado medidas que são absolutamente ineficazes: o aumento da taxa de juros, com grande impacto sobre o crédito, cheque especial, cartão de crédito. As pessoas estão pagando mais juros pelos valores, pelo crédito obtido, que gera uma situação muito mais complexa”, explicou a economista.

Mulheres, dívidas e desemprego

Em poucos meses, lembrou, o processo de endividamento pode duplicar ou até triplicar. Cria-se então uma ciranda em que as pessoas não conseguem sair. Especialmente as mulheres. É um círculo vicioso em que, para poder fazer frente ao crédito, as mulheres têm de contrair mais crédito, tomar mais dinheiro emprestado para pagar dívidas. “E essa é apenas a ponta do iceberg. Aparece agora em momento de crise intensa, mas é um problema estrutural, permanente.”

Marilane comentou ainda que, combinado aos rendimentos menores, um maior número de mulheres está desempregada. E que os níveis de ocupação e o perfil de ocupação das mulheres são muito precários, geralmente sem carteira assinada, informais, incertos, intermitentes. Quase 6 milhões de mulheres exercem trabalho doméstico e 75% delas sem carteira assinada, o que cria também um problema da obtenção de crédito.

O registro em carteira é uma comprovação de renda, que permite muitas vezes obtenção de crédito para pagamento com juros menores. “E quando não tem? Vai conseguir das piores maneiras, tendo de comprometer a maior parte da renda com o pagamento de juros. É um efeito muito severo sobre a obtenção de crédito”, disse.

 Por Redação RBA  

FONTE: REDE BRASIL ATUAL

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