Brasil retoma a pauta do Consenso de Washington
Se aprovada a agenda
proposta, seus reflexos negativos sobre o patrimônio público, o
interesse nacional, os trabalhadores, servidores e os serviços públicos,
com prejuízo para toda a sociedade, serão inestimáveis. O elenco, como
se vê, é amplo, polêmico e complexo. Somente com o povo mobilizado será
possível pressionar o Congresso e evitar esses retrocessos.
Antônio Augusto de Queiroz*
A agenda legislativa para o segundo semestre de 2016, idealizada pelo
presidente interino e pelos presidentes da Câmara e do Senado, retomará
a pauta do Consenso de Washington, em bases fiscalistas e neoliberais,
que esteve na geladeira durante os treze anos de governo do PT.
A prioridade é aprovar uma série de proposições, coincidentes com os
postulados do documento do PMDB, conhecido como “Ponte para o Futuro”,
que atenda os interesses do mercado, especialmente o financeiro, em
detrimento do interesse nacional e dos mais pobres do país.
Na Câmara dos Deputados, agora sob a presidência do deputado Rodrigo
Maia (DEM-RJ), um parlamentar de direita e ultraliberal, a agenda do
ajuste fiscal ganha prioridade, notadamente as proposições que cortam
gastos com pessoal, saúde, educação e seguridade social, bem como com o
enxugamento do aparelho de Estado.
Estão previstas para votação na Casa, já a partir de agosto, as
seguintes proposições: os projetos de lei complementar (PLP) 257/16 e
268/16; o PL 4.467/16; e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC)
241/16, dentre outros de corte liberal.
O PLP 257, em nome de resolver um problema dos estados, que estão
asfixiados financeiramente pelo peso da dívida com a União, propõe uma
série de modificações na Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei
Complementar 101/00, que restringem direitos dos servidores públicos e
forçam a entrega das empresas estatais desses entes para serem
privatizadas pela União.
Já o PLP 268 institui o estatuto ou regime jurídico dos fundos de
pensão com o nítido propósito de entregar a gestão desses ao mercado,
reduzindo ao mesmo tempo a atuação dos participantes e patrocinadores na
direção e nos conselhos deliberativo e fiscal, além de impedir que
dirigente partidário ou sindical possa integrar esses colegiados.
O PL 4.467/16, que representa a gazua que irá entregar o nosso
petróleo às multinacionais do setor, retira da Petrobras a condição de
operadora única bem como elimina a obrigatoriedade de participação com,
no mínimo, 30% nas novas descobertas do pré-sal. Se aprovado o projeto
do pré-sal, o próximo passo será o fim do regime de partilha e a
eliminação do conteúdo local, duas conquistas da gestão do PT em defesa
do interesse nacional.
A PEC 241, que trata do novo regime fiscal, por sua vez, promove a
transferência dos recursos orçamentários do povo para o mercado
financeiro. Ao congelar os gastos governamentais por vinte anos, ela
atribui às despesas sociais (educação, saúde, previdência) e com o
funcionalismo a responsabilidade pelo problema fiscal do país, ignorando
solenemente os custos do governo com juros e amortizações, os
verdadeiros responsáveis pelo déficit público.
No Senado, a pauta incluirá, entre outras proposições polêmicas, a
PEC de Desvinculação de Receitas da União (DRU), a terceirização de mão
de obra, além da regulamentação dos jogos de azar e a securitização da
dívida ativa da União, dentre outros temas.
A PEC 31/16, da DRU, já aprovada na Câmara, aumenta de 20% para 30% a
desvinculação de recursos destinados a áreas como educação, saúde,
previdência, assistência social etc., de tal modo que a União fique
livre para, discricionariamente, aplicar esses recursos como considerar
mais conveniente, inclusive para a geração de superávit primário.
O PLC 30, que trata da terceirização, estende essa modalidade de
contrato para a atividade-fim das empresas, institui a pejotização, que
autoriza a contratação de um serviço em lugar de um empregado, além de
permitir a quarteirização da mão de obra.
Complementam a pauta das duas Casas do Congresso duas outras
proposições, ainda em elaboração no Poder Executivo, que cuidarão da
reforma trabalhista, com flexibilização de direitos, e da reforma da
Previdência, com instituição da idade mínima, entre outras investidas
sobre direitos dos trabalhadores e segurados.
No caso da reforma da Previdência, por exemplo, estão previstas,
entre outras, as seguintes mudanças: aumento da idade mínima para efeito
de aposentadoria, entre 65 e 70 anos; redução da pensão, que passará a
ser de 60% do benefício, mais 10% por dependente; unificação do tempo de
serviço e de contribuição entre homens e mulheres; revisão das
aposentadorias especiais, e sem qualquer transição para quem tenha menos
de 50 anos de idade, mesmo que já tenha mais de 30 anos de
contribuição.
Se aprovada a agenda proposta, seus reflexos negativos sobre o
patrimônio público, o interesse nacional, os trabalhadores, servidores e
os serviços públicos, com prejuízo para toda a sociedade, serão
inestimáveis. O elenco, como se vê, é amplo, polêmico e complexo.
Somente com o povo mobilizado será possível pressionar o Congresso e
evitar esses retrocessos.
(*) Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap. Texto publicado originalmente na revista Teoria&Debate
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